Teatro Gláucio Gill – 05/04/2010 – 13h às 17h.
Diogo, Carolline, Flávia, Adassa e Fabíola.
O tempo foi dilatado. Dentro de um ensaio apenas percorremos muitos caminhos, muitos. Leitura. Trabalho inicial a partir de um trecho da peça que as próprias atrizes selecionaram. Trecho que foi utilizado no decorrer de todo o ensaio. Várias leituras. No decorrer das seis leituras do mesmo trecho, ficou nítido como o tempo era alterado. Como se começa respeitando o tempo proposto pelo texto (pela rubrica) e como depois um longo silêncio não é nada mais do que uma ligeira pausa. Olhar e deslocar. Deslocar a si mesmo e ao outro. Deslocamento pelo espaço. Deslocamento em movimento, sempre. Com nomes (Flávia, Adassa, Fabíola, Vladimir, Estragon, Carolline, Estragon, Pozzo, Vladimir, Godot, Menino…). Raia com os cinco comandos mais básicos durante 30 minutos ininterruptos. Durante a raia, possibilidade de jogar com duas ferramentas que são nossas:
PROPORÇÃO KINESTÉTICA 3:1
PdD: Princípio do Desplugamento
Se a raia fizesse surgir a proporção 3:1, a atriz que fosse esse “1” deveria perfurar o jogo com um relato seu, sobre a necessidade do teatro para ela, sobre o porquê de fazer teatro agora. Se o PdD fosse acionado, deveria ser para olhar o jogo, recebê-lo, analisar suas deficiências e voltar a ele, em seguida, alterando seu rumo. Tomado de ação modificadora. Esses dois movimentos estão ganhando corpo. Sinto que a encenação parte deles, portanto, persistir. Estamos evoluindo nesse sentido.
Pares antagônicos. Fisicalização do estímulo. Cada atriz num trajeto de 0% a 100% tirando o corpo de um registro e o lançando a outro. Flávia com felixibilidade e dureza, algo mais fluido e mais rígido. Adassa mais calma e desesperada. Pessimista e otimista. Fabíola entre o peixe e o gato, entre a languidez e a vigília constante. Carolline entre impulso e forma, entre leveza e peso. Mil leituras possíveis. Importa, antes de dar nome, perceber o corpo como espaço capaz de receber outra coisa que não a habitual. Outra energia. Transitar energias distintas num mesmo corpo. Estamos falando de memória. O que cada corpo daqueles já sentiu? Já viveu? Já percorreu?
Improvisação. 2:2. Enquanto duas faziam a leitura de um trecho (explorando variações, ritmos, repetições, pontuação, intenção…), as outras duas dialogavam pelo corpo, pelo movimento. Em alguns momentos, só o texto gritava, só o texto sofria, enquanto com as atrizes em corpo tudo era divertido e leve. A angústia ficava no texto. Não na encenação. Usaram-se de objetos (livros de GODOT e canetas, lapiseiras…). Numa segunda improvisação, em duplas, cada dupla tinha que entrar e sair do espaço, o intuito era o de expor uma tentativa de levantamento daquele trecho específico da peça que estávamos a trabalhar desde o início. Surgiram coisas de todas as espécies. O que ficou foi a sugestiva troca de livros no lugar de se trocar chapéus. Numa das entradas, uma atriz olhou para mim, ou seja, para o público. Aquilo me instigou. Porque mesmo me percebendo, ela seguiu, como se esse encontro não fosse nada demais. Ou não. Dificuldade em engrenar. Foi ótimo. Confusão ao ouvir uma fala que era do texto mas que parecia ter sido dada pela atriz.
A última improvisação foi maior. Eram as quatro. Das quais, duas eram atrizes, uma era diretora e outra uma espécie de comentadora. Estavam ambas apresentando o processo de montagem do espetáculo. O objetivo era que até o término da improvisação elas tivessem montado realmente a cena sobre a qual passamos o ensaio trabalhando. Elas não conseguiram. Passaram perto mas não conseguiram. Montaram pedaços. Foi engraçado porque a comentadora roubou a atenção o tempo inteiro, enquanto as outras três realmente estavam montando algo. Chegaram a decorar o texto depois de tantas repetições. Mas no meio das falas quase que essencialmente cômicas e debochadas da comentadora, muitas coisas importantes sobre o ato de criação foram pontuadas. Falou-se em repetição, da importância da repetição. Da disponibilidade do corpo. Do jogo. E tudo era motivo para seguir. Se um personagem falava “Como é difícil”, a comentadora se apropriava disso e dizia “É difícil mesmo. Não é fácil…” e assim o jogo seguiu…