11 de janeiro de 2010 – P.25/P.77 – 18h às 20h40
Samuel Beckett: A Busca do Eu
. “a profunda angústia existencial que é a tônica da obra de Beckett” (p.26);
. “Eis aqui uma expressão direta – páginas e páginas dela. E se não a puderem compreender, Senhoras e Senhores, é porque os senhores são por demais decadentes para estar aptos a recebê-la. E nem ficarão satisfeitos a não ser que a forma seja tão precisamente divorciada do conteúdo que lhes seja possível compreender uma sem se preocupar em ler o outro. Essa decantação precipitada e absorção do parco creme sobrenadante de significado é permitida pelo que chamo de um processo contínuo de copiosa salivação intelectual”. (p.27) – Trecho de DANTE... BRUNO. VICO... JOYCE;
. “... a quem sentia que o hábito e a rotina eram o câncer de seu tempo”. (p.29);
. Temas de PROUST (1931): a impossibilidade da posse no amor; a ilusão da amizade;
. WHOROSCOPE, de Beckett;
. REFLECTIONS ON SAMUEL BECKETT’S PLAYS, de Eva Metman;
. A INSUFICIÊNCIA DA LINGUAGEM, de Niklaus Gessner;
. CRÍTICA DA LINGUAGEM, de Fritz Mauthner;
. BARTLEBY, de Melville;
. Em GODOT, a região chamada Vaucluse diz respeito a uma fazenda na qual Beckett trabalhou como agricultor na época da guerra, em 1939, quando fugiu de Paris. Na peça, Estragon nega ter estado lá. Pensar neste espaço da fuga (p.32/33);
. De certa forma, a escrita de Beckett transpira uma luta travada com as palavras, com a clareza, com a busca da essencialidade de cada uma das partes. Tem uma discussão e prática sobre a ferramenta, sobre as palavras e suas composições. Ou seja, já é possível pensar não em algo explicitamente metalinguístico. Mas um prenúncio disto;
. “ESPERANDO GODOT, que anteriormente já havia sido publicada em livro, estreou a 5 de janeiro de 1953 no pequeno Théâtre da Babylone (hoje desaparecido), no Boulevard Raspail... A peça teve cerca de quatrocentas representações no Théâtre de Babylone...” (p.35);
. FIM DE PARTIDA teve sua estreia mundial em Londres, sob direção de Roger Blin (também diretor de ESPERANDO GODOT), no dia 3 de abril de 1957;
. “Pois como disse o próprio Beckett em seu ensaio sobre o Work in Progress de Joyce, a forma, a estrutura e o clima de uma asserção artística não podem ser divorciados de seu significado, de seu conteúdo conceitual; pelo próprio fato de uma obra de arte em seu todo ser seu significado, o que é dito é indissoluvelmente ligado à maneira por que é dito, e não pode ser dito de nenhuma outra maneira”. (p.38);
. “Em ESPERANDO GODOT, o sentimento de incerteza que é criado, e os altos e baixos dessa incerteza – entre a esperança da descoberta da identidade de Godot e os repetidos desapontamentos – são em si a essência da peça. Qualquer tentativa de se chegar a uma interpretação clara e certa por meio do estabelecimento da identidade de Godot através de uma análise crítica seria tão tola quanto tentar-se descobrir contornos definidos escondidos por trás do chiaroscuro de uma tela de Rembrandt pelo simples método de se raspar a tinta”. (p.38/39);
. “Em vez de um desenvolvimento linear, apresentam a inquirição de seu autor sobre a condição humana por um método que é essencialmente polifônico; confrontam o público com uma estrutura organizada de asseverações e imagens que se interpenetram e que devem ser apreendidas em sua totalidade...”. (p.39);
. Sobre ESPERANDO GODOT:
- uma situação estática;
- o segundo ato termina com as mesmas falas, mas ditas pelos personagens em ordem inversa;
- mesmas situações (enfatizando que tudo é a mesma coisa): encontram Lucky e Pozzo (escravo e senhor); tentam o suicídio...
- Vladimir e Estragon têm personalidades complementares (“O contraste entre seus temperamentos dá origem a intermináveis implicâncias mútuas e muitas vezes levam à sugestão de que eles se deveriam separar. Entretanto, sendo naturezas complementares, eles são mutuamente dependentes e têm necessidade de ficar juntos”. P.41/42);
- Pozzo e Lucky também são complementares, porém, num relação em nível mais primário, visto que o primeiro é o senhor sádico enquanto o outro é o escravo submisso. “Pozzo e Lucky representam a relação entre corpo e mente, os lados material e espiritual do homem, com o intelecto subordinado aos apetites do corpo. Agora que as forças de Lucky começam a faltar, Pozzo se queixa que elas lhe causam sofrimentos indescritíveis”. (p.42);
- “O assunto da peça não é Godot, mas a própria espera, o ato de esperar como um aspecto essencial e característico da condição humana. Durante toda a nossa vida, estamos sempre esperando alguma coisa, e Godot representa tão somente o objetivo de nossa espera – um acontecimento, uma coisa, uma pessoa, a morte. Além do mais, é no ato da espera que experimentamos o fluxo do tempo em sua forma mais pura e mais palpável”. (p.43/44);
- Trecho de PROUST: “O indivíduo é a sede de um processo constante de decantação, decantação essa que se processa do vaso que contém o fluido do tempo futuro, inerte, pálido, monocromo, para o vaso contendo o fluido do tempo passado, agitado, multicolorido pelos fenômenos de suas horas”. (p.44);
- Trecho de PROUST: “Nos desapontamos diante da nulidade daquilo que nos apraz chamar nossas realizações. Mas o que é a realização? É a identificação do sujeito com o objeto de seus desejos. O sujeito morreu – e talvez muitas vezes – antes de atingi-la”. (p.44);
- “Esperar é experimentar a ação do tempo, que constitui mudança constante. E, no entanto, como nunca acontece nada de real, essa mudança é ela mesma uma ilusão”. (p.45);
- “Mas mesmo assim Vladimir e Estragon vivem de esperanças: esperam Godot, cuja chegada fará parar o fluxo do tempo”. (p.46);
- Acho mesmo que tem em GODOT a coisa do hábito. “Os sapatos de Estragon torturam-no no primeiro ato, mas no segundo servem miraculosamente bem nele”. (p.48);
- A presença constante do acaso. Poderia ser de um jeito como poderia ser de outro;
- A chegada de Godot é boa e ruim, variando para Vladimir e Estragon;
- Pesquisar sobre Abel e Caim;
- “Em outras palavras, um Deus que não se comunica conosco não pode sentir por nós, e nos condena por razões desconhecidas. Quando Pozzo e Lucky reaparecem no dia seguinte, Pozzo está cego e Lucky mudo, e não se fala mais da feira. Pozzo não conseguiu vender Lucky; sua cegueira em pensar que poderia por intermédio de tal ação influenciar a ação da graça se torna evidente em forma física concreta”. (p.49);
- “A rotina de esperar Godot representa o hábito que nos impede de alcançar a consciência dolorosa, porém fértil, da plena realidade da existência”. (p.52);
- “A esperança da salvação pode ser uma pura evasão do sofrimento e da angústia que nascem da confrontação com a realidade da condição humana”. (p.54);
. Analogias entre ESPERANDO GODOT e FIM DE PARTIDA: “ESPERANDO GODOT se passa numa estrada apavorantemente vazia, FIM DE PARTIDA num cômodo claustrofóbico. ESPERANDO GODOT consiste em dois movimentos simétricos que se equilibram; FIM DE PARTIDA tem apenas um ato que mostra o desgaste de um maquinismo até a sua paralisação”. (p.55);
. “Cada um desses três pares – Pozzo/Lucky; Vladimir/Estragon; Hamm/Clov – é ligado por uma relação de interdependência mútua; eles querem se deixar, lutam entre si, mas dependem um do outro... Essa é uma situação frequente entre duas pessoas – casais, por exemplo – mas é também uma imagem da inter-relação dos elementos dentro de uma mesma personalidade, particularmente quando ela está em conflito consigo mesma”. (p.60/61);
. Clov como Beckett, Hamm como Godot;
. “Essa é também a chave do grande sucesso das peças de Beckett: a confrontação com projeções concretas dos mais profundos temores e ansiedades que até então só haviam sido vagamente experimentados em nível da semiconsciência constitui um processo de catarse e liberação análogo ao efeito terapêutico, na psicanálise, da confrontação com o conteúdo subconsciente da mente”. (p.63/64);
. “ESPERANDO GODOT e FIM DE PARTIDA, as peças que Beckett escreveu em francês, são formulações dramáticas da própria situação humana. Faltam-lhes tanto personagens quanto enredo, no sentido convencional dos mesmos, porque elas atacam sua temática num plano em que nem personagens nem enredo existem. Os personagens pressupõem que a natureza humana, a diversidade da personalidade e de individualidade, é real e tem importância; o enredo só pode existir no pressuposto de que os acontecimentos no tempo têm alguma importância. Esses são justamente os pressupostos que as duas peças põem em dúvida. Hamm e Clov, Pozzo e Lucky, Vladimir e Estragon, Nagg e Nell não são personagens, mas corporificações de atitudes humanas básicas...”. (p.68);
. “A natureza concreta e tridimensional do palco pode ser utilizada para somar novos recursos à linguagem como instrumento do pensamento e da exploração da existência”. (p.74/75);
. “A linguagem nas peças de Beckett serve para expressar o desmoronamento, a desintegração, da linguagem. Onde não há certeza não pode haver significados definidos – e a impossibilidade de se jamais atingir a certeza é um dos principais temas das peças de Beckett”. (p.75);
. “Num mundo sem objetivo, que perdeu seus últimos alvos, o diálogo como toda ação, é reduzido a um simples jogo para fazer passar o tempo...”. (p. 76);
. “... o uso que Beckett faz da linguagem... é um ataque à complacência fácil e barata dos que acreditam que falar de um problema é resolvê-lo, que o mundo pode ser dominado por classificações e fórmulas bem arranjadas. Tal complacência é a base de um processo contínuo de frustração”. (P.76).
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Comentários e citações a partir da leitura do capítulo "Samuel Beckett: A Busca do Eu" presente em O TEATRO DO ABSURDO, de Martin Esslin.
Segue o link do capítulo (em inglês):
http://search.barnesandnoble.com/booksearch/isbninquiry.asp?userid=Ua7CkyfB6y&ean=9781400075232&displayonly=CHP#CHP
Segue o link do capítulo (em inglês):
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