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terça-feira, 9 de fevereiro de 2010
.tudojuntoaomesmotempo.
primeiro
godot surgiu quando eu achei que não aguentava mais esperar. godot é necessidade de resposta. é da ordem das necessidades. é explicável, sim, mas passionalmente impossível de classificar. sobre ele pode-se tudo dizer. ele é escape. é válvula. tudo nele encontra sentido. é espaço aberto para o precipício da alma. godot é ode ao otimismo. é no-nilismo. é no-pessimismo. é utopia concretizada. é bonito porque são jogos para amenizar os buracos da estrada. é tentativa erro e dissolução. é tentativa erro tentativa e dissolução. é sarau de sinônimos. é seguir sem fim nem começo. é o meio do caminho que significa, no meio das contas, estar vivo.
segundo
fui então buscar algo para explicar a intuição. queria algo que pudesse assinar embaixo do que tenho sentido, algo que pudesse me dar um motivo bem concreto e argumentado para poder dizer sem medo de ser eu mesmo: a nossa noção de espera está alterada. é espera. mas espera noutro tempo. mudaram-se os tempos. mudaram-se as formas. o nome sobrevive. o nome inda é espera. mas o como, a duração, a qualidade. tudo isso mudou. então, caí em outro universo (dentro deste ainda).
terceiro
universo da velocidade voracidade desmedida vontade. universo do prazer. da psicanálise. eu fui ver - em mim primeiro e sempre - como em mim havia a vontade de concretizar o instante sonhado. como a espera não durava mais que algumas horas. como eu encontrava saída como eu encontrava quase toda forma de saciedade. eu me encantei ao perceber - com horror - como eu substituía assim facilmente um amor por outro recém-inventado. eu não estou buscando o outro eu estou buscando a tampa do meu buraco. o amor é nome dado às tampas. caramba. meu desejo se muito aguardado vira implicância, vira desimportância, vira indiferença e nada demais. eu preciso beijar a minha boca alguma boca que possa a minha dizer: fostes beijada. és boca querida. és, você, boca, amada.
quarto
e então o tempo retorna para me dizer que ele passou. ele volta para dizer que as ruínas viraram prédios e que os prédios viraram ruínas. o tempo volta para dizer que as torres que caíram tinham sido antes construídas e que agora novas torres se ergueram, ainda mais altas, e que em breve, deduzo eu, deverão também cair. bom, daí o tempo volta e pede silêncio. eu não entendo o motivo. eu não entendo a pausa em meio compaso. mas é que estando nós assim em silêncio, todo grito interior sufocado, todo desejo adormecido, todo recalque, bom, tudo isso enfim acaba gritando. não é grito, mas é que estando em silêncio, um soprar vira furacão. e da barriga eu escuto outra vez saindo a voz da fome, da necessidade (?), é preciso comer ou se morre. é preciso ter prazer ou se morre. é preciso. não podemos negar.
quinto
o godot que eu esperei quando chegou tão rápido foi comido. o godot já comido como resto tão rápido foi esquecido. depois, quando o godot chegou - de tanto antes ter sido desejado - bom, quando ele chegou eu o comi de novo em movimentos largos. e depois, caí no chão e fiquei resvalando sobre qualquer coisa sobre a civilização. e fez-se fome de novo e fez-se o homem em excreção. e agora: aqui espero de novo para tapar os buracos dos dentes. eles têm fome. eles, e tudo dentro de mim, configurou-se como gentes. tudo é possível de desejo. tudo dorme em paz mas saliente. esperando a hora ou o segundo no qual um pêlo do corpo se ergue e clama ao conjunto todo: vem carne aí, gente.