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quarta-feira, 30 de dezembro de 2009

Da estrutura que os abarca faz décadas...

 
Ipiabas, 25 de dezembro de 2009.

Ainda estou pensando neste jogo da cena que se converte no próprio jogo das personagens. É possível traçar aproximações, espelhamentos, alguma analogia? Sendo possível, o jogo da cena é o jogo dos personagens. O jogo entre os atores é o mesmo jogo entre as personagens. Por exemplo, em NÃO DOIS, (a partir do texto Pas-de-Deux de Eduardo Pavlovsky) os atores Dan Marins e Natássia Vello jogavam um jogo de repetição de uma mesma partitura (como atores), assim como seus personagens jogavam um jogo de repetição de movimentos que haviam feito faz tempo, mas que precisavam repetir para não esquecerem. Houve um encontro entre os dois jogos. Um jogo que servia tanto aos atores enquanto desafio, estética, forma, como um jogo que servia à dramaturgia, à dramaticidade.

Se eu resolvo partir da noção de espera (que considero estar fatigada), assim, o jogo proposto deve tentar evidenciar esta necessidade da encenação. O jogo deve relacionar espera e o cansaço em relação a esta, ou seja, o jogo deve revelar o quanto esta espera (proposta por Beckett) está fora de contexto hoje em dia. Para isso, devo pensar em qual jogo possibilitará o desenho desta leitura. Devo pensar os recursos, os meios pelos quais tornar esta opinião legível. Eis que me deparo com a idéia de metalinguagem, a partir do cansaço (não somente meu em relação à espera, mas, sobretudo, cansaço das personagens em relação aquela história – estrutura – que os abarca faz décadas).

Não quer dizer que conseguiremos. Quer dizer que haverá um esforço para desconsiderar este modelo de espera, esta leitura da espera, justamente para que consigamos nos afastar dela e voltar à mesma, não por desejo, mas por inevitabilidade. Para voltarmos ao mesmo com clareza, qualidade. A espera – real, a - histórica, atemporal – nos traga de volta, sempre, para a sua obviedade, para a sua originalidade.

A noção de metalinguagem. Serve-me em primeiro lugar porque pode expressar o cansaço não somente meu em relação à espera, mas também das personagens, já que elas estariam tão cansadas quanto eu estou. É compreensível?

Pela metalinguagem, nós poderíamos converter o jogo da espera para um jogo que se refere também ao ato de criação. A espera num processo criativo é algo muito angustiante. É uma etapa. Faz parte do processo. Lidamos também com ela, inevitavelmente, em se falando da construção de uma obra teatral. Por exemplo, falando bem romanticamente, esperamos o momento de “encontrar o personagem”, o momento em que o ator sente que realmente se encontrou a seu personagem. Esperamos a hora de colocar os figurinos, de jogar com o cenário, com a luz. Esperamos a luz. Esperamos a cena, o texto decorado, esperamos o público. O público entrando na sala de espetáculo é uma primeira espera que é saciada de forma brusca e violenta.

“Que bom que vocês chegaram, gente. A gente já não agüentava mais esperar”.

Referência Bibliográfica
Guénoun, D. (1977). O teatro é necessário? São Paulo: Perspectiva.