Mais material produzido em improvisações faladas, como costumamos dizer.
Justamente. Há uma pretensão do fazer teatral contemporâneo que é querer impor sobre uma dada obra uma nova leitura, como se a obra já não tivesse nela mesma uma visão de mundo. Nós, pelo contrário, nos permitimos assinar junto ao Beckett.
O importante para nós foi ressaltar o quanto o ser humano está fadado ao sofrimento. E o texto de Beckett nos fala disso, do homem enquanto mendigo, vagabundo, escravo de sua própria existência.
Angústia, crise existencial, sofrimento, solidão, dor, esfacelamento, vazio, vazio, vazio... Ainda é importante para vocês falar de tudo isso? Vocês ainda acham que tais assuntos sejam questões na contemporaneidade?
O texto original de Beckett é uma obra do pós-guerra, época em que a Europa – e o mundo – estavam destruídos. Como é que a encenação de vocês lida com esse referencial? Como vocês dão conta dessa questão histórica e extremamente fundadora da nossa civilização?
Fico comovido com a ousadia de se resgatar um teatro tão marcado historicamente, mas o fato é que o espetáculo de vocês não nos acrescente nada de novo. Ele se estagna de tal forma que se torna incoerente com o universo que a gente vive. Então, eu me pergunto: por que se estacionar em um tempo que não nos diz mais nada?
Vocês falam como se realmente o teatro tivesse essa função de resgatar memória, uma função de entregar preciosidades ao público de uma nova geração. Eu queria saber se vocês acham que é bom para quem assiste, receber um espetáculo que não diz absolutamente nada da nossa realidade. Eu digo, os tempos mudaram, estamos no início do século XXI, com outras questões, outros vislumbramentos...
A nossa montagem não se estaciona no tempo. Esperando Godot possui uma dramaturgia tão rica que é digna de prêmio Nobel e que fortifica e torna visível temas que ainda hoje são muito contemporâneos através de uma metáfora da condição humana. Dizer que a nossa montagem é ultrapassada é negar a vida de hoje da forma como ela se manifesta.
Não entendo porque montar Esperando Godot na íntegra. Com duas horas de duração em torno de uma coisa que todos nós sabemos que não vai levar a lugar algum... Vocês continuam esperando Godot?